[...] a contribuição
específica da Filosofia que se coloca ao serviço da liberdade, de todas as
liberdades, é a de minar, pelas análises que ela opera e pelas ações que
desencadeia, as instituições repressivas e simplificadoras: quer se trate da
ciência, do ensino, da tradição, da pesquisa, da medicina, da família, da
política, do fato carcerário, dos sistemas burocráticos, o que importa é fazer
aparecer a máscara, deslocá-la, arrancá-la… (Châtelet, s.d., p. 309).
François
Châtelet foi um
historiador da Filosofia, filósofo, político e professor francês. No fragmento
de texto acima, o nosso filósofo nos fala de como o ensino da filosofia
pode contribuir no sentido de libertar as pessoas, no caso os alunos da disciplina,
de todos os tipos de amarras sociais a que estamos submetidos, de sorte a
proporcionar a verdadeira liberdade.
Em
nosso cotidiano temos nossa liberdade tolhida por uma série de instituições que
influenciam nossas atitudes e nos limitam. Há uma enorme gama de organizações
sociais que nos reprimem duramente, tais como: tradição, família, política,
burocracia estatal, a indústria cultural, etc. Essa limitação de nossa liberdade muitas vezes está a
serviço da classe social dominante, que se utiliza das instituições que cria ou
domina para perpetuar seu status quo mediante a geração de conceitos,
preconceitos, hábitos, leis, que organizam e conduzem as massas sociais, de
acordo com os propósitos dessa classe. Tais mecanismos quase sempre permanecem
ocultos sob a superfície da vida cotidiana.
Cabe à Filosofia a tarefa
de, através do ensino, principalmente, desvelar essa realidade tornando-a
compreensível às pessoas em geral e aos alunos em particular. Criar nos alunos
a capacidade de analisar as suas próprias atitudes e quantificar o quanto essas
atitudes e hábitos são impostos pelo senso comum sem a devida análise é
fundamental. Na reflexão sobre os fundamentos do conhecimento e seus fins, a
Filosofia investiga os instrumentos do pensar, como a lógica e a metodologia,
distingue e compara as diversas formas de apreensão do real, como o mito, a
religião, a ciência, o senso comum e a própria filosofia, esta que desempenha,
ainda, a função de crítica da cultura.
Châtelet denota
em seu texto, que a Filosofia, por desenvolver nos alunos um olhar crítico
sobre a sociedade, tem a condição de gerar, de forma natural, um poderoso
potencial de mudança social. Além de dar transparência à máscara, a filosofia,
nas próprias palavras do nosso filósofo, cria condições para que esta seja
deslocada, arrancada. A Filosofia, assim, exige coragem. Filosofar é mais que
um exercício puramente intelectual, é criar fundamento, base, para o confronto
com as forças que mantém e sustentam as máscaras, as aparências, abrindo espaço
para as mudanças. A procura pela verdade, que é característica da Filosofia,
consiste em expor aquilo que está oculto pelo costume, pela tradição, pela
religião, pelo poder, pelas instituições que estão a serviço da manutenção do domínio
da minoria sobre as massas. Apenas conhecendo-se a realidade é possível
transformá-la. Nesse contexto, o ensino da Filosofia, tão temido pelas “elites”,
pode garantir os recursos intelectuais necessários para o indivíduo alterar a
sua condição social e adquirir autonomia, em outras palavras, conquistar a sua
própria liberdade.
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