Maquiavel (1469-1527) viveu na república de
Florença, numa época de instabilidade política, da hoje Itália, mas que na
época estava dividida em principados e repúblicas onde cada Estado possuía a
sua própria milícia e nenhum deles tinha capacidade de unificar o país, como já
acontecera em Portugal e Espanha, por exemplo.
Maquiavel não foi apenas um teórico
da política, mas um político que viveu a prática da luta pelo poder, na
Florença tradicionalmente mantida sob a influência da família Médici, mas que
num determinado momento esteve sob o governo do republicano Soderini. Nessas
mudanças de poder, Maquiavel perdeu o cargo, foi preso acusado de traição
contra os Médicis, torturado e, depois de libertado passou, no exílio, a
teorizar sobre a política a partir de suas experiências pessoais e estudos
históricos.
Para Maquiavel a história é cíclica,
isto é, as situações e respectivas soluções tendem a se repetir. Da mesma forma,
boas soluções encontradas para os problemas do passado podem servir para os
mesmos problemas do presente.
A novidade do pensamento de
Maquiavel está na reavaliação das relações entre ética e política. Maquiavel
defende a moral laica, secular, de base naturalista, diferente da moral cristã,
predominante na época, mas ao mesmo tempo estabelece a autonomia da política. Para
a moral cristã há valores espirituais superiores aos políticos onde o bem comum
da cidade se subordina ao bem supremo da salvação da alma. A nova ética de
Maquiavel analisa as ações não mais em função de uma hierarquia de valores a
priori, mas em função das consequências dos resultados da ação política. Não se
trata de amoralismo, mas de uma nova moral centrada nos critérios de avaliação
do que é útil à comunidade. Dessa forma se é o bem da comunidade que define o
que é moral, então constitui um dever do governante manter-se a todo o custo no
poder, mesmo com o emprego de meios cruéis, do uso da força e da guerra,
espionagem e todo o tipo de violência. Um príncipe fraco não tem como se manter
muito tempo no poder. Para Maquiavel a avaliação moral não deve ser feita antes
da ação política segundo as normas gerais, principalmente da igreja, mas a
partir de uma situação específica e em função da ação política, já que esta
visa sempre o bem comum.
Com a moral cristã, a priori,
predominante em sua época colocada num segundo plano e a nova moral laica
baseada no bem comum suplantando-a, claro que Maquiavel foi mal interpretado,
demonizado mesmo. A leitura não isenta e
apressada de sua obra levou à criação do mito do maquiavelismo, que tem
atravessado os séculos. Maquiavélico, na
linguagem comum, significa pessoa sem escrúpulos, traiçoeira, astuciosa, que,
para atingir seus fins, usa de todos os métodos mais abjetos, como a mentira, a
má fé e a violência. Essa visão de Maquiavel e sua obra é muito comum, mesmo
nos dias de hoje.
No livro “Maquiavel: Um homem
incompreendido”, o autor Michael White demonstra que Maquiavel nada tinha de
“maquiavélico”, era um homem comum, que amava o seu país, bom marido, embora um
pouco infiel, que gostava de beber com os amigos e era um dedicado funcionário
público. Não era cruel ou sedento pelo poder. Apenas sonhava com a unificação
da sua Itália, o que iria acontecer apenas muitos séculos depois.
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