A moral numa sociedade consiste, segundo Schulze:
“...nos valores que são compartilhados por esta como conteúdos a serem
seguidos”.
A moral, portanto, depende da interação humana.
Depende dos padrões aceitos em cada sociedade, como vemos neste texto de
Schulze:
Quando o indivíduo age de acordo com algum desses
padrões, é elogiado ou, pelo menos, não sofre nenhuma sanção por isso; já
quando não age, é reprimido, o que pode ir de um olhar de repreensão à privação
da liberdade ou mesmo, em alguns países, à sentença de morte.
Quanto maior a intensidade do valor do padrão
social, do valor socialmente compartilhado, que se desrespeita, maior é a
punição recebida por isso... Desta forma, fica claro que a moral é exterior e
anterior ao indivíduo, pois quando este nasce, ela já está constituída. (SHULZE,
2013, p.10).
Dessa
forma um homem se isolado da sociedade não poderia viver moralmente. Qualquer
ação sua seria ditada apenas por sua vontade. Não haveria interação humana, ele
não teria como adquirir os valores de alguma sociedade, não haveria a
possibilidade de julgamento de valores nem de aplicação de sanções.
Tendo
em vista que um indivíduo nasce em uma sociedade e que absorve os valores nela
vigentes, pode parecer que esses valores jamais serão modificados. Essa impressão
não corresponde à realidade como podemos ver nesta citação de Schulze:
Como nos afirmam Aranha e Martins (2003, p. 302): “À
medida que a criança se aproxima da adolescência, aprimorando o pensamento
abstrato e a reflexão crítica, ela tende a colocar em questão os valores
herdados”.
Diante da moral constituída, se o
indivíduo, por meio da sua reflexão crítica, não concordar com os padrões estabelecidos,
cabe-lhe a luta por mudanças nesses padrões com o objetivo de transformá-los em
conteúdos que, portanto, lhe possibilitem seu projeto de vida. Pelo menos,
assim deveria ser. Porém, justamente o contrário também pode acontecer; afinal,
podemos ter um indivíduo que, por não lutar contra os padrões morais vigentes
com os quais racionalmente não concorda, pode até usar essa vigência como
desculpa para não realizar seu projeto de vida, ou mesmo para nem mais
ocupar-se com a análise desses padrões. Temos, com essa renúncia à luta contra
padrões morais com os quais não se concorda criticamente, uma espécie de letargia
moral: o indivíduo até segue os padrões, mas o faz sem nenhuma reflexão
crítica. Diante disso tudo, podemos afirmar que o indivíduo não só é
herdeiro da moral, mas seu criador. (SCHULZE, 2013, p.12)
O homem age moralmente em sociedade, mas o que
ocorre em situações extremas em que seu bem estar físico ou sua existência
mesma está em risco? Temos em Platão, em sua narrativa acerca dos últimos
momentos da vida de Sócrates a resposta:
Quanto a mim, não é de
agora, sempre fui deste feitio: não cedo a nenhuma outra de minhas razões,
senão à que minhas reflexões demonstram ser a melhor. As razões que alegava no
passado, não as posso enjeitar agora em vista de minha sorte presente; elas se
me apresentam como que inalteradas; são as mesmas de antes as que estou
respeitando e acatando; se nestas conjunturas, não temos outras melhores para
alegar, fica certo de que não cederei absolutamente a tuas instâncias; ainda
que, com mais ameaças que as atuais, nos acene o poderio da multidão, como a
crianças, com o espantalho das prisões, mortes e confisco de bens.
Por conseguinte,
partindo desses princípios nos quais concordamos, devemos averiguar se é justo
que eu tente sair daqui sem permissão dos atenienses, ou injusto: se se provar
que é justo, tentemos; se não, desistamos. (PLATÃO, p.5)
No diálogo de Platão, Sócrates nos deixou um grande
exemplo quando preferiu morrer a abrir mão de seus princípios morais.
Mesmo sendo injustiçado em seu julgamento, Sócrates
não retribuiu injustiça com injustiça. Esse é o comportamento adequado para o
filósofo que assim o justifica:
Sócrates- Logo, jamais
se deve proceder contra a justiça. Critão- Jamais, por certo. Sócrates- Nem
mesmo retribuir a injustiça com a injustiça, como pensa a multidão, pois o
procedimento injusto é sempre inadmissível... . Sócrates- Em suma, não devemos
retribuir a injustiça, nem fazer mal a pessoa alguma, seja qual for o mal que
ela nos cause. (PLATÃO, p.9).
Retribuir o mal na mesma moeda seria, portanto, em
Platão, reproduzi-lo ao infinito.
Referências bibliográficas:
SCHULZE, Carmelita. Que é ética?: livro didático/ Carmelita Schulze; Designer instrucional Marina Melhado Gomes da
Silva; Projeto gráfico e capa Equipe UnisulVirtual. -1ª ed. Palhoça:
UnisulVirtual, 2013.
PLATÃO. Diálogos
Platônicos De Platão, CRITÃO (Críton), ou o DEVER Extraído do livro
Diálogos. da coleção Clássicos Cultrix. Tradução: Jaime Bruna. Disponível em: file:///F:/Filosofia%20Unisul/Terceiro%20semestre/Que%20%C3%A9%20%C3%A9tica/Livros%20e%20textos/Criton%20-%20em%20portugues.pdf
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