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Mostrando postagens de 2018

Arte como resistência política: uma reflexão

Em tempos de governos autoritários e regimes políticos de exceção, os quais não são novidade em terras Tupiniquins, arte e artistas, sempre foram elementos de resistência, verdadeiras fortalezas contra o arbítrio dos usurpadores do poder. Procuraremos, a partir de textos de dois filósofos brasileiros: Benedito Nunes (1989, p. 90-98) e Marcelo Mari (2012, p. 423-431), refletir sobre a relação entre arte e política no Brasil dos anos ‘60 e ’70, período inserido, portanto, na fase mais violenta do Golpe Militar de 1964. Evidentemente tais reflexões poderão ser aplicadas em outros contextos sociais e recortes históricos. Benedito Nunes, a partir das teorias do historiador e filósofo positivista francês Hyppolite Taine e do filósofo alemão Karl Marx, analisa a influência do meio físico e social sobre a produção artística. Para Taine, “o meio físico determina a diversidade racial, as diferenças de raça determinam certos traços físicos e psíquicos que refletem nos sentimentos dos indiví

Sobre a questão da escassez e o Malthusianismo

A questão da relação entre a oferta de alimentos e o crescimento da população é uma questão que preocupa os economistas desde o surgimento das ciências econômicas. Afinal é a ciência que estuda a atividade produtiva, sendo a escassez seu problema fundamental (LEITE, 2016, p. 10-12). Já no século XVIII, Thomas R. Malthus em sua obra “Ensaio sobre a população”, de 1798, apontava uma “total incompatibilidade entre a capacidade de reprodução humana e a possibilidade de produção de meios de subsistência” de forma que a população cresce em progressão geométrica e os meios de subsistência em progressão aritmética. (MENDONÇA, 2011, p. 2-3). Malthus era contra a intervenção do Estado no sentido de amenizar a miséria. Essa é a base do pensamento dos atuais neomalthusianos que preconizam a necessidade de redução da população mundial para que se garanta o abastecimento de alimentos. Os neomalthusianos defendem inclusive soluções desumanas para o problema como permitir a morte de grandes continge

Hegel, o conceito de direito de emergência ou estado de necessidade e o Brasil de hoje.

O professor Roberto Romano, citando Hegel, trata no artigo "Violências" da questão do chamado direito de emergência ou estado de necessidade. É, em outras palavras, o fundamental direito à vida. A questão que se coloca é se o direito à vida, por ser absolutamente fundamental, pode se sobrepor a outros direitos, como, por exemplo, ao direito de propriedade. Nas próprias palavras de Hegel: sim. Em situações extremas, emergenciais, onde o supremo direito à vida está em risco, o direito à propriedade pode ser relativizado.  De fato, não há violação maior que aquela que atenta contra o direito à própria existência do indivíduo, uma vez que seria uma violação infinita do próprio ser, uma total ausência de direito. Nessas circunstâncias o roubo, com o objetivo de garantir o direito à vida, poderia ser, enquanto exceção, aceito. Não seria um roubo como qualquer outro. Seria um roubo que teria por objetivo garantir o direito de emergência, garantir o direito à vida. Roubo moralmente j

A predominância da Ciência Aplicada e da Tecnologia sobre a Ciência Pura: razão empobrecida?

A meta dos iluministas e depois dos positivistas era, através da razão objetiva e da racionalidade, alcançar o progresso no conhecimento, no aperfeiçoamento moral e na emancipação social de forma a construir uma sociedade onde o desenvolvimento humano fosse progressivo, contínuo e global. A razão objetiva geraria, assim, uma forma de conhecimento racional, metódico, objetivo, confiável, preciso, verdadeiro, desinteressado, neutro (independente de opiniões) e progressivo. No âmbito da filosofia desenvolvida na Escola de Frankfurt, temos a leitura de que após a chegada ao poder a burguesia promove a ascendência da razão instrumental (subjetiva) e a consequente decadência da razão objetiva, que se propusera emancipatória da sociedade, como um todo. Cabe aqui diferenciar o conhecimento científico puro (ciência pura - razão objetiva), a aplicação prática deste conhecimento (ciência aplicada – razão subjetiva) e, finalmente, o desenvolvimento industrial destinado a utilizar os conhecim

A Escola de Frankfurt e a neutralidade da ciência

Para Adorno e Horkheimer, bem como para os demais integrantes da Escola de Frankfurt, o emprego do método científico não garante a objetividade da ciência. Em outras palavras, para os frankfurtianos a ideia tradicional da neutralidade da ciência não se sustenta apenas pela racionalidade. Podemos perceber claramente essa posição no texto a seguir: As raízes da suposta neutralidade científica, técnica, operacional encontram-se na organização da classe burguesa que, quando ainda distante do poder, objetivou na ideia de “progresso” – prefigurada pelo Iluminismo e configurada pelo Positivismo – uma justificativa para as suas transformações sociais e o seu projeto de emancipação. Entretanto, ao alcançar as posições de poder, a burguesia transformou, rapidamente, o conceito de progresso em ideologia, a razão em racionalização, a libertação em opressão. CARDOSO, E. M.; ELIAS, E.O.   As aporias do projeto moderno: considerações à luz do pensamento de Adorno .   IN: Educação em Revista,

A imagem tradicional da ciência: características

A partir do século XVI, após a primeira revolução científica, a Ciência foi se tornando, paulatinamente, independente das outras formas de conhecimento, como a Filosofia e a Religião. Com o advento do Iluminismo e sua meta do esclarecimento, ou seja, o objetivo de dissolver mitos e alcançar o progresso no conhecimento e domínio da natureza, no aperfeiçoamento moral e na emancipação social, a Ciência foi se tornando mais e mais importante. A partir dessa visão iluminista e, posteriormente, do positivismo, foi sendo gestada a imagem tradicional da ciência que está impregnada até hoje na sociedade, embora essa visão tenha sido contestada e criticada já há mais de meio século nos meios acadêmicos, notadamente pelos integrantes da Escola de Frankfurt. A ciência, na ótica dos iluministas e positivistas, é uma forma de conhecimento de caráter metódico , ou seja, que adota um método de pesquisa como instrumento para alcançar seus objetivos. Entenda-se por método o caminho, a sequência de

A concepção de poder em Michel Foucault

Ao conceber o conceito de poder, Foucault parte de duas hipóteses, a do poder como repressão e a do poder como guerra. Ambas as hipóteses representam críticas ao economismo, ou seja, Foucault propõe instrumentos diferentes de análise onde o poder não é modelado exclusivamente pelas relações econômicas como nas concepções marxista ou jurídica clássica. Na primeira hipótese, também chamada hipótese de Reich, o filósofo propõe que o poder não é um bem que se troca, se dá ou se retoma. Não é uma coisa. O poder não se tem, se exercita. Poder é exercício, portanto, poder é o que reprime. O poder reprime a natureza, os instintos, as classes sociais, os indivíduos. Analisar o poder é em Foucault, analisar os mecanismos de repressão.   A segunda hipótese, também chamada de hipótese de Nietzche, propõe que o poder não é manutenção das relações econômicas, mas é uma relação de força. Dessa forma o poder não deve ser analisado em termos de contrato, alienação, recondução de relações de produção,

O pensamento político de Hegel em duas linhas

Hegel, ao contrário das tradições contratualista e jusnaturalista, não pensa o homem como indivíduo associado fundador do Estado a partir de um hipotético estado da natureza. Em outras palavras, em Hegel o homem não parte de um estado da natureza, seja violento ou paradisíaco, para, por necessidade, fundar o Estado. O filósofo inverte essa ideia e concebe o Estado como o próprio fundador da sociedade civil. Os contratualistas, para Hegel, cometem o erro de confundir Estado e sociedade civil, quando partem do interesse particular do indivíduo como formador do Estado. Dessa forma Hegel aproxima-se da tradição aristotélica para a qual o cidadão constitui-se como tal na polis. É na polis e apenas nela que o ser humano se realiza em toda a sua potencialidade. Para Hegel, os contratualistas pensam o Estado como deveria ser e não como ele é. Ao contrário dos contratualistas, em Hegel há limites para o direito de propriedade. Esse limite é o direito de sobrevivência física e espiritual dos

Isomorfia entre a linguagem e a realidade em L.Wittgenstein.

Um dos aspectos fundamentais do Tractatus Logico-Philosophicus (TLP) de L. Wittgenstein (L.W) é a concepção pictórica da proposição. Para o filósofo, nossos pensamentos são expressos em forma de linguagem. A linguagem se expressa por meio de proposições. As proposições têm por função expressar os fatos por nós percebidos. Em outros termos, são nossas representações ou figuras lógicas dos fatos. A proposição é a imagem da realidade, a pintura dos fatos. Não só dos fatos atuais, mas de todos os fatos possíveis. Os fatos, no espaço lógico, são a totalidade do próprio mundo. Dessa forma, para L.W., o mundo só pode ser conhecido por meio da análise da linguagem. Assim, se toda a figura é uma representação da realidade, ela pode ser comparada com a realidade material de modo que possamos atribuir-lhe um valor de verdade ou falsidade. Tudo o que pode ser expresso por meio de uma proposição corresponde ao fato, aquilo que existe e está no domínio da realidade. No pensamento de L.W, do TLP,

Filosofia da Linguagem: teorias da referência.

A referência pode ser conceituada como a relação que obtemos entre as expressões usadas por um falante e os objetos de quem essas expressões falam. Por exemplo, as expressões: “Vaclav Klaus é um Democrata” ou “A montanha de ouro está localizada na China”. No primeiro caso temos um nome próprio e sabemos que a expressão é verdadeira já que se refere a um indivíduo conhecido. No segundo, sabemos que não existe “montanha de ouro”, que é uma expressão chinesa que significa lugares que possuem muito ouro. Verificamos que, embora existam palavras referenciais em ambas as sentenças, a primeira se refere a objeto da realidade, a outra não. As grandes questões sobre referência podem, então, ser reduzidas a três: qual o mecanismo da referência?, qual a relação entre referência e significado? e qual a relação entre referência e verdade? No campo da filosofia da linguagem, as teorias da referência partem do princípio de que expressões de linguagem possuem determinados valores, os quais são atrib

Filosofia da Linguagem x Ciências da Linguagem

Tanto a filosofia da linguagem como as ciências da linguagem tem por objeto de estudo a linguagem. No entanto há diferenças de abordagem entre os filósofos da linguagem e os cientistas. As ciências da linguagem, como a linguística, a psicolinguística, as neurociências, etc, estudam a linguagem em sua estrutura geral de signos enquanto ato genuinamente humano; o que ocorre com o nosso corpo quando nos comunicamos usando a linguagem; as relações entre a estrutura humana e a estrutura da linguagem; estuda, ainda, o funcionamento do processo de linguagem nos limites da própria estrutura da linguagem. A filosofia da linguagem, por sua vez, extrapola os limites estruturais da linguagem em busca de uma ótica da totalidade do objeto de estudo, a linguagem, e sua relação com outros objetos e com a própria realidade. Na investigação filosófica, a linguagem é considerada mais que uma forma de comunicação, mas sim um elemento a estruturar a própria relação do homem com a realidade, com o mundo.