Educação, de
forma genérica, pode ser entendida como o ato de transmitir às novas gerações
um determinado conjunto de valores e conhecimentos. Essa atividade educativa
assume, em cada época e lugar, formas distintas. Podemos falar, assim, em
diferentes pedagogias. Para compreendê-las há que se interpretá-las no seu
contexto histórico e à luz dos valores e ideias que as fundamentam. Dessa
maneira, na antiguidade, a pedagogia conhecida e utilizada pelos povos hindus,
persas, chineses e egípcios era tradicionalista e consistia na transmissão de
uma doutrina sagrada, cujo objetivo era orientar o jovem na busca da felicidade
e da virtude. Na Grécia antiga, a educação como transmissão da cultura, da
história e da religião era baseada na perspectiva mítica, sendo difundida
através dos poemas de Homero (A Odisseia e A Ilíada). A passagem do mito à
razão, através da reflexão filosófica, deu-se com os pensadores pré-socráticos
e levou ao surgimento da primeira instituição de ensino com características das
que hoje conhecemos: a Akademia, de Platão, que contava com uma organização
escolar, um corpo organizado de conhecimentos, espaço próprio e regulamentos
internos. Aristóteles, o mais conhecido discípulo de Platão, fundou também sua
escola, o Liceu. Ambos foram os grandes expoentes da filosofia grega antiga e
desenvolveram suas próprias teorias (idealista e realista, respectivamente).
Mesmo diferentes, as teorias buscam o mesmo: determinar a essência das coisas e do homem. A natureza seria imutável e
acessível à reflexão filosófica.
Essa ideia de
que há uma noção pré-determinada de “ser humano”, definida como sua essência, é
a base das chamadas pedagogias
essencialistas. A educação, segundo essa tendência, consiste em realizar o
que o homem deve vir a ser. A concepção essencialista na educação não se limita
apenas à antiguidade. Estendeu-se, através do modelo de ensino cristão, passando
por toda a Idade Média até o século XVII, já na Idade Moderna. Embora a noção
da essência do homem tenha se alterado ao longo do tempo, em função do
predomínio dos valores cristãos medievais e do pensamento filosófico moderno,
seja o racionalista de Descartes ou o realista de John Locke, as concepções
sobre os objetivos da educação permaneceram com as mesmas características, ou
seja, influenciadas pela busca, filosófica ou religiosa, por uma “essência do
homem”.
Com
Jean-Jacques Rousseau, no século XVIII, surge a primeira pedagogia considerada não
essencialista. No bojo do Iluminismo, marcado pela ascensão da burguesia ao
poder e pelas tensões entre a Reforma protestante e a Contrarreforma, a nova
ciência e os dogmas da igreja, e o debate entre racionalistas e empiristas;
caracterizado pela busca do progresso e desenvolvimento do homem baseada na
razão, surge a reinvindicação do ensino laico e universal, sem fundamentação
religiosa e de responsabilidade do Estado. Tais princípios são os responsáveis
pela forma de organização escolar que conhecemos hoje. A fundamentação do ideal
iluminista tem sua base filosófica ancorada no empirismo, que rejeita as
concepções metafísicas anteriormente predominantes e limita os saberes
possíveis à experiência. Para os iluministas caberia à razão iluminar os caminhos
da humanidade, antes envolto nas trevas do dogmatismo religioso e filosófico. A
pedagogia de Rousseau segue essa linha iluminista. Para o filósofo a educação
deve ser conduzida pelas luzes da razão, de forma a tornar o homem livre para
encontrar o seu próprio caminho evolutivo, o que diferencia sua pedagogia em
relação ao essencialismo, uma vez que, não há mais a concepção de “essência
humana” a ser alcançada pela educação. Com o desenvolvimento extraordinário das
ciências, a partir do empirismo tradicional, surge a epistemologia naturalista,
segundo a qual o conhecimento advém unicamente da realidade sensível, da
experiência prática. A epistemologia científica naturalista projetou uma imagem
do homem como um corpo vivo, produto da evolução natural das espécies. Um
organismo biológico. Um ser formado por moléculas de carbono e cujo
comportamento é determinado pelo impacto do meio físico e social sobre sua
genética herdada. Seu corpo pode ser dividido em numerosos sistemas e estudado
pelos vários ramos da ciência e suas diversas e, por vezes, conflitantes
teorias. Da mesma forma, a natureza e a sociedade são objeto de estudo de diferentes
ciências, cada uma delas especializada em uma das partes do todo. Essa
perspectiva empirista do homem radicalizou-se, ainda mais, após o surgimento do
positivismo. A perspectiva naturalista
científica e sua nova visão do ser humano, da sociedade e da natureza,
influencia a educação até os nossos dias através da pedagogia naturalista, que
aplica métodos científicos na educação e na análise de seus resultados. A
perspectiva naturalista, portanto, assumiu esse caráter mais objetivo e
metódico das ciências.
A objetivação
excessiva do ser humano e as relações de ensino abstraídas do contexto social,
próprias do naturalismo fez surgir a sua oposição: a perspectiva, crítica, histórico-social. Não há uma única
escola crítica situada no tempo e no espaço ou ligada a um determinado autor.
Ao contrário, ela se refere a um posicionamento crítico não só com relação às
tendências pedagógicas tradicionais, como também à própria estrutura social e
econômica vigente, como um todo. Alguns elementos comuns caracterizam essa
linha de pensamento: a consciência da desigualdade social e o papel da educação
como instrumento de manutenção ou de libertação frente ao “status quo”, a
compreensão da formação humana e social como um processo histórico e a
reavaliação das relações sujeito-objeto e professor-aluno no processo
pedagógico. Dessa forma, a pedagogia histórico-social procura superar não só o
essencialismo, como também a perspectiva naturalista. A perspectiva crítica,
assim, concebe o homem não como cristalizado numa imagem acabada universal e
abstrata nem como simplesmente limitado à sua condição biológica enquanto
espécie animal. O homem sob a perspectiva histórico-social é determinado pelas
relações que estabelece tanto com o meio ambiente natural quanto com o meio
social através do trabalho, da política, das relações familiares e sociais. Ao
mesmo tempo em que o homem é produto do meio social, também tem condições de
intervir sobre esse meio, alterando-o e, consequentemente, intervindo na forma
como esse novo meio ambiente natural e social irá determinar o homem das
gerações futuras. É clara, nessa perspectiva, a importância do processo
pedagógico, não apenas no que concerne ao posicionamento do ser humano no seu
contexto histórico, como também, e, principalmente, na sua capacidade de mudar
os rumos da história. A pedagogia critica opõe-se à pedagogia liberal, que
surgiu com a instituição do capitalismo, com a revolução industrial. O projeto
pedagógico liberal visa uma educação dual, isto é, dividida em dois tipos de
escola, uma voltada para a burguesia, detentora dos meios de produção e capaz
de formar líderes, e outra voltada para a classe trabalhadora, destinada à
formação de mão de obra produtiva e barata. A pedagogia histórico-social, ao
contrário, busca, a partir da filosofia de Rousseau, Hegel, Karl Marx, Antonio
Gramsci, Jean-Paul Sartre, Piaget e Vygotsky, entre outros, romper com o modo dogmático
e linear de interpretar a realidade. Pretende conscientizar o educando sobre o
contexto histórico em que se encontra, de forma que possa compreender o embate
contínuo entre forças opostas dentro do capitalismo, o qual Marx chama de luta
de classes. Tem por objetivo, ainda, enfatizar a força da instituição escolar
no processo de reprodução da sociedade de classes e da manutenção do “status
quo”, de acordo com o pensamento filosófico de Gramsci e seu conceito de “hegemonia
de classe”.
Referências bibliográficas:
SANTA CATARINA.
Proposta
Curricular : Uma Contribuição para a Escola Pública da Pré-Escolar, 1o Grau, 2º Grau e Educação de Adultos.
Florianópolis. Secretaria de Estado da Educação/ Coordenadoria de Ensino, 1991.
TARGA, Dante Carvalho. Filosofia, Educação e Sociedade – Livro didático. Palhoça:
UnisulVirtual, 2015.
bom texto. Esclarecedor.
ResponderExcluirExcelente... muito obrigada, me ajudou muito!
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